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Reforma Tributária: como a proposta do Governo pode impactar no Ceará

Setor de educação pode ser um dos mais afetados com o aumento da carga tributária FOTO: Adobe Stock

Apresentada ao Congresso Nacional na última terça-feira, 21, a primeira parte da proposta de reforma tributária, que prevê a unificação de dois impostos (PIS e Cofins) em um único novo tributo, a Contribuição Sobre Bens e Serviços (CBS), com alíquota única de 12%, tem preocupado alguns setores da economia cearense. Conforme especialistas ouvidos pela TrendsCE, da forma como está disposto, o projeto do Governo Federal pode desencadear um aumento na carga tributária para alguns segmentos e prejudicar a retomada econômica pós-crise.

Assessor econômico da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec) e PhD em desenvolvimento regional, Lauro Chaves Neto considera o texto apresentado como uma “reforma parcial”, o que, segundo ele, frustra a classe produtiva. “Esperava-se uma proposta que pudesse atacar a causa principal da ineficiência do nosso sistema tributário atual, que é complexo e injusto”, comenta. Conforme diz, o ideal seria otimizar o tempo que as empresas levam em apurar impostos e reduzir as desigualdades entre os setores da economia.

“O sistema brasileiro está muito centrado nos impostos sobre o consumo, o que é o principal problema da carga tributária nacional, porque na hora que você taxa consumo, você está tratando todo mundo igual. É preciso taxar, principalmente, renda, patrimônio, lucro, dividendos e heranças, pois aí vai estar dentro do princípio contributivo de que quem pode mais, paga mais”, afirma Lauro Chaves.

Ainda de acordo com o assessor econômico da Fiec, outro ponto importante e que ainda não foi abordado pelo Governo é a transparência. Segundo ele, para ser participativa com a sociedade, a reforma tributária deve criar mecanismos para informar quanto exatamente as pessoas e as empresas pagam de tributos, e pra onde exatamente aqueles recursos estão sendo destinados.

Educação

Um dos setores que mais pode ser afetado negativamente com a reforma tributária, da forma como foi apresentada, é o de educação. Conforme o professor Airton Oliveira, presidente licenciado do Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino do Ceará (Sinepe-CE), as escolas, que atualmente arcam com uma alíquota de 3,5%, passarão a ter que pagar os 12% previstos pela CBS, quase quatro vezes a mais do que é praticado no momento.

“A rede de ensino particular, historicamente, é um das mais tributadas do Brasil. Até no Simples Nacional as alíquotas da educação já são 50% maiores do que aquelas praticadas no comércio, que já é uma atividade bastante onerada. Meu temor é que haja um aumento generalizado”, pontua o professor Airton Oliveira.

Conforme o texto apresentado pelo Governo, é possível compensar o pagamento da CBS com o crédito do que já foi pago pelos fornecedores de serviços ou matéria prima contratados pelas escolas, evitando a cumulatividade de tributos. Para o presidente licenciado no Sinepe-CE, entretanto, isso não será suficiente para que a alíquota se mantenha no mesmo patamar da atualidade.

“É preciso pensar em reforma tributária no Brasil, mas, dessa forma, pode haver um efeito reverso na educação, já que um aumento da carga estimulará a evasão escolar, sobretudo entre as famílias mais pobres. A equipe econômica precisa ter cuidado e sensibilidade para não onerar ainda mais a rede privada, que é parceira direta da rede pública e gera muitos empregos. Será lamentável se não houver um olhar diferenciado para a educação brasileira”, afirma Airton Oliveira.

O professor pondera, ainda, que na maioria dos países desenvolvidos a educação nem mesmo é tributada, uma vez que favorece o desenvolvimento social, estimula a criação de novas tecnologias, o empreendedorismo e fortalece toda a economia local no longo prazo.

Bancos

Quem também não ficou satisfeito com a proposta do Governo foi o setor bancário. Apesar de elogiar a iniciativa, considerada necessária para “simplificar um sistema com muitas distorções”, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) ressaltou que a reforma mantém alta carga de impostos no setor.

“A carga tributária final sobre o setor financeiro será ainda maior. Isso porque o Brasil é um dos poucos países que tributa a intermediação financeira. Essa tributação subirá 24,7% sobre a alíquota atual dos tributos unificados, de 4,65% (PIS/Cofins) para 5,80% (CBS). Ainda serão mantidos a mesma base de cálculo e o regime cumulativo, enquanto os demais setores poderão se creditar amplamente no novo modelo não cumulativo”, destaca a Febraban, em nota.

A Federação também informa que a participação da carga de tributos no spread bancário subirá, conforme a proposta do Governo, de 19,3% para 20,3% só por conta da majoração da alíquota do PIS/Cofins (de 4,65% para 5,8%). “A carga tributária final sobre o setor financeiro, de 45% de IRPJ e CSLL, somada ao aumento da alíquota para 5,8% (CBS), será mantida como a mais elevada dentre outros setores, não tendo havido qualquer redução de alíquota”, diz a Febraban.

A entidade, entretanto, afirma que acredita na reforma e que a mesma é importante para o aprofundamento dos debates e estudos sobre a matéria, o que ocorrerá durante sua tramitação no Congresso Nacional.

Eventos

Presidente do Sindicato das Empresas Organizadoras de Eventos e Afins do Estado (Sindieventos-CE), Circe Jane Teles também revela preocupação com um aumento real na carga tributária em decorrência da reforma. Segundo ela, o setor cearense de eventos, um dos mais prejudicados pela crise da Covid-19, pode ser bastante prejudicado caso o texto não seja alterado no Congresso.

“A reforma tributária, da maneira como foi proposta, gera uma possibilidade real de aumento na carga tributária, principalmente para os prestadores de serviços, onde estão incluídas as empresas de eventos”, afirma Circe Jane Teles.

Segundo a presidente do Sindieventos-CE, a maioria das empresas do setor está enquadrada no Simples Nacional, mas os tributos, conforme a Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE), ficam em torno de 17% a 22%. “Para ser mais atrativa ao setor de eventos, a reforma tributária precisa rever essas alíquotas e, sobretudo, desburocratizar os processos fiscais”, comenta.

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